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Nova espécie de cigarrinha-da-cana é confirmada no Brasil após décadas de confusão

Descoberta pode redefinir estratégias de manejo e aumentar a eficiência no controle da praga

Uma descoberta recente feita por pesquisadores brasileiros promete redefinir o entendimento sobre uma das principais pragas da cana-de-açúcar. Cientistas da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS) e da Universidade Estadual Paulista (Unesp) identificaram uma nova espécie de cigarrinha-da-cana, denominada Mahanarva diakantha. Durante décadas, o inseto foi erroneamente classificado como espécies semelhantes, o que pode ter contribuído para falhas em métodos de controle adotados nas lavouras.

A pesquisa teve início em 2015, quando o professor Gervásio Silva Carvalho, da PUCRS, recebeu amostras de cigarrinhas (Mahanarva sp.) oriundas de plantações do Sul e Sudeste do país. As pragas eram provenientes de áreas que registravam baixa eficiência no combate com inseticidas convencionais, levantando a suspeita de que se tratava de um inseto diferente daquele tradicionalmente conhecido pelos produtores.

Com experiência em taxonomia, Carvalho foi responsável por analisar a morfologia dos exemplares, buscando diferenças anatômicas em relação às espécies mais estudadas. Pouco tempo depois, o professor Diogo Cavalcanti Cabral-de-Mello, do Instituto de Biociências da Unesp, em Rio Claro – SP, também recebeu amostras da mesma origem — algumas delas já examinadas pelo colega gaúcho.

Cabral-de-Mello, especialista em citogenética e genômica, observou variações cromossômicas e genéticas que indicavam a possibilidade de uma nova espécie. Sem conhecimento prévio das análises morfológicas realizadas pela equipe da PUCRS, ele não poderia, no entanto, confirmar a hipótese de forma isolada. A descoberta se consolidou quando os dois grupos de pesquisa uniram esforços, ampliando a coleta de exemplares em várias regiões brasileiras.

O trabalho conjunto resultou na descrição formal da Mahanarva diakantha, publicada no Bulletin of Entomological Research com apoio da FAPESP. A nova espécie se diferencia geneticamente e morfologicamente de suas parentes mais conhecidas, Mahanarva fimbriolata e Mahanarva spectabilis. De acordo com os cientistas, a M. diakantha pode apresentar ciclo de vida distinto, comportamentos ecológicos próprios e até resistência superior aos inseticidas convencionais — fatores que interferem diretamente na produtividade e no manejo agrícola.

“Essas cigarrinhas pertencem a um grupo de espécies crípticas, ou seja, muito parecidas visualmente”, explica a pesquisadora Andressa Paladini, primeira autora do estudo e hoje professora da Universidade Federal do Paraná (UFPR). “Durante as análises, notamos diferenças na genitália dos machos, o que sugeria tratar-se de uma espécie não descrita. Em eventos científicos, encontramos outros grupos trabalhando com o mesmo gênero e decidimos unir as pesquisas”, recorda.

O nome Mahanarva diakantha faz referência à estrutura bifurcada da genitália do macho — “dois espinhos”, em grego. Além da morfologia, a confirmação envolveu análises genéticas com o gene COI (citocromo C oxidase), amplamente usado para diferenciar espécies. “As variações no DNA mitocondrial eram pequenas, o que isoladamente não bastava para definir uma nova espécie. Somente a combinação entre genética e morfologia confirmou a descoberta”, destaca Cabral-de-Mello.

A distinção entre M. diakantha, M. fimbriolata e M. spectabilis é praticamente invisível a olho nu. Todas coexistem nas mesmas regiões do Sul e Sudeste do país. Assim, a identificação precisa exige o sequenciamento genético ou a dissecação de machos, já que a diferença anatômica só pode ser observada internamente.

Os cientistas também utilizaram um terceiro método de comparação: a morfometria geométrica, técnica que avalia a forma e proporção das asas. As análises apontaram diferenças estatísticas significativas entre as três espécies, reforçando a separação taxonômica. “As evidências sugerem que a diferenciação entre elas é relativamente recente, o que fica claro nas comparações genéticas e anatômicas”, explica Cabral-de-Mello.

A confirmação da nova espécie levanta a necessidade de revisar pesquisas anteriores sobre cigarrinhas-da-cana. Ao examinarem coleções entomológicas, os cientistas identificaram exemplares de M. diakantha coletados há mais de 60 anos, mas rotulados incorretamente — o mais antigo datado de 1961, identificado como M. fimbriolata. Diversos estudos antigos não especificam critérios de identificação, o que sugere que diferentes espécies possam ter sido estudadas como se fossem uma única.

Os próximos passos incluem a ampliação da coleta de amostras para mapear com precisão a distribuição da nova espécie no país e avaliar seu impacto sobre a produtividade da cana. Os pesquisadores também pretendem investigar a diversidade genética da M. diakantha, etapa essencial para aprimorar estratégias de controle biológico e químico.

“Com a descrição formal, abre-se uma série de novas possibilidades de pesquisa e manejo. É um passo importante tanto para o avanço científico quanto para o fortalecimento do setor sucroenergético”, conclui Paladini.

O artigo completo — Shades of red: several lines of evidence reveal a pest of sugarcane as new species of Mahanarva (Hemiptera: Auchenorrhyncha: Cercopidae) — está disponível em: doi.org/10.1017/S0007485325100503

(foto: Andressa Paladini/UFPR)

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