Açúcar vira a chave para superávit

Oferta global pode superar o consumo em até 6,5 mi t em 2025/26
O mercado mundial de açúcar entra em fase de mudança estrutural. Após dois ciclos de aperto, o balanço 2025/26 tende a sair do déficit e migrar para superávit, com estimativas que vão de equilíbrio a +6,5 milhões de toneladas. A virada já aparece nas cotações: em Nova York, o bruto cai mais de 17% no ano e opera encurralado entre 16 e 17 c/lb.
A leitura foi apresentada por Luciana Torrezan, gerente sênior de inteligência de mercado da BP Bioenergy, na 8ª Conferência NovaCana, realizada nos dias 15 e 16 de setembro, na capital paulista. Com mais de uma década acompanhando oferta e demanda globais, Luciana ressaltou que a curva passou a oscilar ao redor da paridade com o etanol no Brasil, ancorando um piso técnico em ~15 c/lb ao menos até o 1º tri/2026.
Brasil: pêndulo do mix e a “aposta” na cristalização
O vetor doméstico continua sendo o mix açúcar/etanol. Para a safra corrente, a produção deve fechar entre 40 e 40,5 milhões de toneladas, reflexo de janelas em que o etanol voltou a remunerar em estados como São Paulo. Para 2025/26, há dois trilhos:
Cenário conservador (Czarnikow): 40,6 mi t, com moagem 580–600 mi t e alocação mais equilibrada entre açúcar e etanol
Cenário de maximização do açúcar: até 47,4 mi t (+5%), mesmo com moagem <600 mi t, via uso intensivo da capacidade de cristalização e paradas mais curtas.
“Produtores do Brasil e da Tailândia aguardam preços melhores”, disse Pedro Mizutani, diretor da Czarnikow e palestrante no evento, destacando que para 2026 o setor já trabalha com moagem próxima de 620 mi t, apesar da redução de área em alguns polos e da necessidade de renovação de canaviais.
Etanol: pivô de preços e demanda resiliente
O mercado interno segue demandante de etanol, observou Ulysses Carvalho, Senior Trader da Sucden. A paridade hidratado/açúcar virou o novo driver da curva: quando o hidratado melhora, o mix encolhe a produção de açúcar e dá sustentação a NY; quando o açúcar rende mais, a oferta cresce e as cotações cedem. No exterior, a Índia acelera o programa de biocombustíveis, enquanto o milho no Brasil e nos EUA amplia a competição intercommodities.
Índia, Tailândia e Europa reordenam o “trade flow”
Índia: produção entre 10,5 e 12 mi t, a depender de monções e doenças; exportações potenciais ~2 mi t recolocam o país no comércio e mexem nas origens preferidas da Ásia e Oriente Médio. O avanço do etanol disputa cana com o açúcar.
Tailândia: ~11 mi t, estabilizando embarques regionais, ainda vulnerável ao clima.
Europa: estagnação; superar o patamar atual depende de janela climática favorável.
Consumo desacelera: novo risco estrutural
O crescimento da demanda perdeu tração: ~3% a.a. nos anos 2000 para ~0,7% a.a. nos últimos oito anos. Além de impostos e políticas de saúde, os análogos de GLP-1 — já usados por ~10% dos americanos — reduzem em até 30% a ingestão calórica dos usuários, adicionando incerteza à trajetória de consumo. Projeções independentes apontam crescimento orgânico de ~1,3 mi t/ano, bem abaixo do passado.
Logística: gargalos, areia e diversificação de portos entram no radar
A virada fundamental precisa ser acompanhada por eficiência logística. Rodrigo Ostanello, líder de açúcar para as Américas na ED&F Man, lembra que “a logística é fator crítico da competitividade brasileira”.
Em 2023, o país moeu 595 mi t de cana, produziu 40,9 mi t de açúcar e 32,5 bilhões de litros de etanol. A capacidade de exportação já alcança 10 mi t por trimestre, com diversificação para portos não tradicionais (Antonina, Imbituba, São Sebastião) que reduz a dependência dos eixos Santos/Paranaguá.
O executivo apontou ameaças recorrentes como contaminação por areia em terminais — problema sistêmico que eleva custos, deteriora qualidade e pode afastar compradores.
E a capacidade de contêineres apertada em janelas de pico, pressionando fretes e viabilização de negócios.
Destacou também oportunidades como os investimentos em transbordo e terminais que encurtam o giro e aumentam a confiabilidade surgem como oportunidades.
Como também, a expansão do corredor do etanol — o Brasil já exporta ~14 milhões m³/ano e pode acrescentar 2 milhões t equivalentes em destinos como Índia, à medida que o país asiático eleva mistura de biocombustível.
Para Ostanello, o próximo ciclo exigirá padrões de qualidade mais rígidos e coordenação entre produtores, tradings e operadores portuários para sustentar margens num ambiente de superávit e preço comprimido.
Compartilhe este artigo:
Veja também:
Açúcar vira a chave para superávit
Açúcar entra na “semana da decisão”
Você também pode gostar
Confira os artigos relacionados: