Agosto pode redefinir os rumos do mercado de açúcar e da política brasileira

Arnaldo Correa, diretor da Archer Consulting, professor e técnico de gestão de risco em commodities agrícolas, analisa em seu comentário semanal os desdobramentos do mercado futuro de açúcar e as interferências externas que colocam em xeque tanto os fundamentos econômicos quanto o equilíbrio político brasileiro. Na semana de 07 a 11 de julho de 2025, o contrato de açúcar com vencimento outubro/25 em Nova York subiu 18 pontos, fechando a 16.56 centavos de dólar por libra-peso, um leve avanço que corresponde a 4 dólares por tonelada.
Essa movimentação positiva ficou concentrada nos contratos de curto prazo. Já os vencimentos mais longos — especialmente aqueles que abrangem parte da safra 2026/27 e 2027/28 — apresentaram recuo, influenciados pelas fixações antecipadas das usinas, que estão de olho nos valores em reais por tonelada, impulsionados pela alta cambial da semana.
Com a valorização do dólar em 2,6% — puxada pelo anúncio do presidente norte-americano de que imporá tarifas sobre todos os produtos brasileiros a partir de 1º de agosto —, o real se desvalorizou e abriu espaço para boas oportunidades de fixação cambial futura. No acumulado semanal, os preços médios do açúcar para as safras futuras se valorizaram: 63 reais por tonelada na 26/27 e 14 reais na 27/28. O dólar fechou cotado a R$ 5,5624.
Estimativas da safra sob pressão: clima, ATR e TCH preocupam
As projeções iniciais de que a produção de açúcar superaria 40 milhões de toneladas parecem cada vez mais distantes da realidade, à medida que os números do campo revelam outro cenário.
Segundo os dados atuais, a produção de cana deve oscilar entre 569 e 595 milhões de toneladas, com o ATR sofrendo reduções importantes. Simulações indicam que dificilmente haverá recuperação — a curva de ATR tende a permanecer abaixo das duas últimas safras.
Um fator crucial nesse momento é o comportamento dos fundos de investimento, que estão vendidos em 132.248 lotes, o equivalente a 6,7 milhões de toneladas de açúcar. Para pressionar o mercado para baixo, os fundos precisaram de um volume expressivo — mas, para empurrar o mercado para cima, a reversão pode ser abrupta e com menos lotes.
Essa potencial saída das posições vendidas, caso ocorra, poderá ser traumática. O grande enigma do momento é: qual será o gatilho que provocará essa virada?
Primeira quinzena de agosto pode ser decisiva
Como já antecipado em análises anteriores, o mercado pode viver um ponto de inflexão importante na primeira quinzena de agosto, quando os dados acumulados da safra trarão maior clareza sobre os impactos climáticos, cambiais e estruturais. Até lá, os movimentos permanecem fortemente influenciados por variáveis como clima, dólar, atuação dos fundos e fundamentos agrícolas.
Nos bastidores, circula a informação de que dois grandes fundos internacionais estiveram visitando empresas do setor agrícola nos últimos dias — com interesse em açúcar, café, suco de laranja, soja e algodão. O movimento indica que há olhos atentos ao Brasil, não apenas como fornecedor de commodities, mas como epicentro de tensões estratégicas mais amplas.
Geopolítica de Murano: Trump, Lula e o teatro do absurdo
Encerrando com uma reflexão geopolítica mordaz, Arnaldo Correa compara a recente ofensiva do ex-presidente Donald Trump à diplomacia de um “hipopótamo em surto dentro de uma loja de cristais de Murano”. Ao impor tarifas unilaterais sobre o Brasil, Trump ofereceu, sem querer, um presente político a Lula, que viu surgir o vilão externo perfeito para mobilizar sua base e tentar reconstruir sua frágil coalizão.
Mais do que isso, o gesto de Trump embaralhou os planos da direita brasileira, que agora precisa explicar à opinião pública como conciliar o apoio a um político estrangeiro que trata o Brasil como colônia. A cena do governador Tarcísio de Freitas usando o boné vermelho MAGA (“Make America Great Again”) foi emblemática: uma coreografia de subserviência que caberia num desfile escolar do século XVI.
O agronegócio, antes entusiasta silencioso desse alinhamento, agora rangeria os dentes. A direita, por sua vez, busca desesperadamente um candidato para 2026 que não pareça uma caricatura de bajulador tropical, enquanto o país enfrenta desafios concretos que exigem liderança — e não animadores de auditório ou clones ideológicos de uma extrema-direita importada.
O Brasil está diante de dois pontos de inflexão: um na safra, outro na política. Ambos exigem clareza, estratégia e coragem — ingredientes raros no atual cardápio institucional e partidário.
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