Reconhecida a consolidação das áreas de preservação permanente situadas no bioma Mata Atlântica
No dia 06 de abril do corrente ano, o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, publicou no Diário Oficial da União o Despacho nº 4.410/2020, que determinou a aplicação do Código Florestal (Lei nº 12.651/2012), mais precisamente de seus artigos 61-A e 61-B, no que tange ao reconhecimento da consolidação de áreas de preservação permanente existentes em imóveis situados no bioma Mata Atlântica.
Desde o ano de 2017, o entendimento do Ministério do Meio Ambiente, corroborado pelo despacho nº 64.773/2017-MMA, editado pelo então ministro do Meio Ambiente, Sarney Filho, era no sentido da inaplicabilidade do instituto da consolidação aos imóveis situados no bioma Mata Atlântica.
Os principais fundamentos utilizados para afastar a aplicabilidade do instituto da consolidação aos imóveis situados no bioma Mata Atlântica eram: i) retrocesso ambiental que essa aplicação geraria; ii) antinomia (conflito entre leis) entre a Lei nº 12.651/2012 e a Lei nº 11.428/2006; iii) regulamentação do instituto da área de preservação permanente no bioma Mata Atlântica pela lei específica (Lei da Mata Atlântica) e não pela lei geral (Código Florestal).
Quanto ao suposto retrocesso ambiental, pautado no artigo 225 da Constituição Federal, que garante direito ao meio ambiente saudável e ecologicamente equilibrado para as presentes e futuras gerações, ainda mais após o julgamento pelo Supremo Tribunal Federal quanto à constitucionalidade do Código Florestal, essa tese foi afastada.
No julgamento que se encerrou no STF com a decretação da constitucionalidade do Código Florestal, entendeu-se que citada legislação não trouxe retrocesso às normas de preservação do meio ambiente, tendo apenas compatibilizado a exploração econômica com a preservação ambiental, não tendo suprimido nenhum dos institutos de preservação previstos na legislação anterior (Lei nº 4.771/65).
Desse modo, sendo considerado constitucional o Código Florestal, dentre eles seus artigos 61-A e 61-B e não havendo retrocesso ambiental com sua promulgação, também não há que se falar em retrocesso ambiental quanto à consolidação das áreas de preservação permanente no bioma Mata Atlântica, sendo refutada essa primeira tese com base nesse fundamento.
Noutro ponto, quanto à suposta antinomia entre a Lei nº 12.651/2012 e a Lei nº 11.428/2006 no que tange as áreas de preservação permanente, foi entendido que a Lei da Mata Atlântica apenas disciplinou a proteção da vegetação nativa existente dentro dos limites das áreas de preservação permanente e, em momento algum, disciplinou acerca de eventuais explorações comerciais que, porventura, existiam e existem dentro das APPs desde antes de 22 de julho de 2008.
Visto isso, entendeu-se não haver conflito entre as duas leis, pois uma disciplina a preservação da vegetação nativa (Lei nº 11.428/2006) e a outra (Lei nº 12.651/2012), em seus artigos 61-A e 61-B, disciplina a manutenção de eventual exploração existente dentro dessas áreas de preservação permanente. Disciplinando os pontos distintos, não há que se falar em conflito entre as ditas leis, mas sim em complementariedade.
Na mesma linha, entendeu-se que a regulamentação de regras gerais acerca do regime de proteção das áreas de preservação permanente existentes em qualquer bioma, dentre eles a Mata Atlântica, foi feita pelo Código Florestal e não pela Lei da Mata Atlântica, de modo que não se poderia admitir a aplicação de apenas alguns dispositivos sobre as APPs previstos no Código Florestal e se excluir, apenas e tão somente, a aplicação dos artigos que versam sobre a consolidação (artigos 61-A e 61-B).
Vejamos abaixo trechos do Parecer nº 00115/2019/DECOR/CGU/AGU nesse sentido:
“Não obstante, não é isso que se verifica. O Código Florestal é a Lei que disciplina normas gerais sobre a proteção da vegetação, inclusive sobre as áreas de preservação permanente, consoante se infere do seu art. 1º-A[15], e essa matéria não foi tratada na Lei da Mata Atlântica.
Por seu turno, o regime de proteção da APP é estabelecido pelo art. 7º do Código Florestal, e não pela Lei da Mata Atlântica. Nesse sentido, admitir a aplicação desse dispositivo ao bioma e não admitir a aplicação dos arts. 61-A e 61-B da mesma Lei, seria admitir a aplicação parcial da norma, o que não se mostra viável juridicamente.”
Por fim, com a publicação do despacho nº 4.410/2020 pelo Ministério do Meio Ambiente, todos os órgãos vinculados a ele deverão reconhecer a aplicabilidade do instituto da consolidação, agora também em áreas inseridas no bioma Mata Atlântica, podendo ser revistos, mediante pedidos expressos, autos de infração e multas originadas sob o fundamento anterior.
Diego Henrique Rossaneis – Advogado da Canaoeste