Tratos culturais e colheita ampliam pressão sobre custos da cana no Centro-Sul e Nordeste, aponta CNA
Diferença estrutural entre regiões evidencia velocidade distinta de mecanização e maior sensibilidade do Nordeste ao custo da mão de obra e ao diesel
O avanço dos custos agrícolas voltou ao centro das discussões do setor sucroenergético em 2025. Dados do projeto Campo Futuro, da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), mostram que tratos culturais e colheita seguem respondendo por mais de dois terços do custo operacional da cana, consolidando-se como as etapas mais sensíveis às oscilações de preços de insumos, combustíveis e mão de obra. O levantamento reúne painéis realizados em 2024 e 2025 no Centro-Sul e Nordeste, considerando a diferença regional no calendário de safra.
No Centro-Sul, o Custo Operacional Efetivo (COE) subiu 15,4% por hectare e 12,9% por tonelada, atingindo R$ 8.531/ha e R$ 106,34/t na safra 2025/26. A alta foi impulsionada principalmente pelos tratos culturais, cujo custo avançou 10,1% e alcançou R$ 3.520/ha, pressionado por fertilizantes que seguem sujeitos à volatilidade internacional e às oscilações cambiais. A colheita, por sua vez, registrou aumento de 5,9%. As despesas administrativas e de capital de giro também pesaram: dispararam 50,6% e 30,3%, respectivamente, em ambiente de juros elevados.
Centro-Sul avança na mecanização enquanto Nordeste mantém dependência da mão de obra
O Nordeste apresentou comportamento distinto. O COE recuou 2,4% por hectare, mas aumentou 7,3% por tonelada, chegando a R$ 7.125/ha e R$ 130,98/t na safra 2024/25. A região registrou queda nos gastos de colheita (-4,1%) e nas despesas administrativas (-17,9%), embora os tratos culturais tenham permanecido praticamente estáveis (+0,5%). A menor intensidade tecnológica e a escala produtiva mais reduzida ajudam a explicar essa estabilidade, embora os custos por tonelada permaneçam mais altos que no Centro-Sul.
A composição do COE evidencia diferenças estruturais. No Centro-Sul, operações ligadas a maquinário e mão de obra respondem por 45% do custo por tonelada; no Nordeste, essa fatia sobe para 58,5%. A discrepância decorre da maior dependência da mão de obra rural, que representa 23% do COE nordestino, quase o dobro do observado no Centro-Sul. O resultado é um custo unitário mais elevado e mais sensível a reajustes salariais e encargos.
Os insumos agrícolas exibem padrão oposto. No Centro-Sul, representam 33,1% do custo unitário, ante 24,8% no Nordeste. Fertilizantes e corretivos mantêm participação relevante, 20,4% no Centro-Sul e 19,3% no Nordeste. O avanço dos preços internacionais dessa categoria, a partir do segundo semestre de 2024, pressionou o setor, mas a apreciação do real no início de 2025 atenuou impactos para o Centro-Sul. O Nordeste, com safra defasada, não se beneficiou do movimento cambial.
Tratos da cana-soca ampliam divergência entre regiões
Nos tratos da cana-soca, os movimentos foram opostos entre as regiões. No Centro-Sul, o custo com maquinário recuou 10,5%, de R$ 8,81/t para R$ 7,88/t, com redução significativa em reparos, manutenção e gastos de frota própria. Embora o ICMS tenha elevado o preço do diesel no início de 2025, o combustível retornou aos níveis da safra anterior no início do ciclo, mantendo o gasto médio estável em R$ 0,43/t. A mão de obra também teve redução expressiva, de 67,6%, impulsionada pela queda de 90,9% no uso de mão de obra própria, substituída por operações mecanizadas e serviços terceirizados.
O Nordeste registrou aumento de 6% no custo total com maquinário, passando de R$ 7,46/t para R$ 7,89/t. O gasto com maquinário próprio caiu 11%, mas os serviços terceirizados avançaram 29%, indicando reconfiguração operacional. A mão de obra, por sua vez, caiu 63%. Entretanto, a dinâmica interna foi divergente: a mão de obra própria subiu 41%, enquanto a terceirizada despencou 75%, revelando redistribuição de atividades entre equipes internas e contratadas.
Colheita reforça diferenças estruturais e sensibilidade ao diesel
Na colheita, o maquinário voltou a ser determinante. No Centro-Sul, os custos subiram 4,7%, puxados por serviços terceirizados (+9,8%), enquanto o maquinário próprio recuou 16,6%. O Nordeste enfrentou alta mais acentuada, de 24,8%, com crescimento tanto nas operações próprias (+37,5%) quanto nas terceirizadas (+24,7%). A dinâmica reflete o impacto do diesel: o aumento no início de 2025 pressionou o Nordeste, cuja safra estava em andamento, enquanto o Centro-Sul iniciou o ciclo em ambiente de queda nos preços.
A participação da mão de obra na colheita diminuiu drasticamente nas duas regiões. O uso de mão de obra própria deixou de compor os custos, e apenas o Nordeste manteve alguma presença de trabalhadores terceirizados, ainda que em recuo. A mecanização avança de forma constante, mas mais lentamente no Nordeste, devido a restrições estruturais como relevo e fragmentação de áreas.
Modernização avança, mas diferenças regionais seguem determinando competitividade
O conjunto dos dados mostra que o Centro-Sul aprofunda um modelo de produção mais mecanizado e intensivo em tecnologia, com maior terceirização e redução consistente de custos de mão de obra e frota própria. No Nordeste, a modernização segue ritmo mais lento, com convivência entre sistemas tradicionais e restrições operacionais. A maior dependência do trabalho rural e a sensibilidade ao diesel ampliam o custo por tonelada e mantêm o diferencial competitivo entre as regiões.
Na avaliação da CNA, tratos culturais e colheita seguem determinando a competitividade regional da canavicultura, em ambiente marcado por juros altos, volatilidade dos insumos e necessidade crescente de eficiência operacional. A heterogeneidade produtiva exige estratégias diferenciadas, ajustadas às especificidades logísticas e estruturais de cada região, para mitigar riscos e ampliar a rentabilidade agrícola.
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