As quatro faces para o sucesso
Os relatórios de produtividade de cana no Estado de São Paulo indicam que as regiões mais novas na cultura ainda – e já se vão mais de 15 anos desde a última grande expansão -, não conseguiram igualar seus números frente às regiões mais tradicionais.
Uma desculpa que sempre esteve na ponta da língua dos conformistas é o ambiente de produção mais severo. Contudo, ao ver o salto de produtividade do Triângulo Mineiro essa história cai imediatamente por terra.
Outro caso que mostra a injustificável baixa produção de toneladas por hectare é o do empreendimento canavieiro liderado pelo produtor de Barretos, José Armando Milani. Se ele fosse resumido em uma única palavra, esta seria “integração”.
Sua propriedade é testemunha do auge da pecuária na região na década de 60, sendo uma das primeiras a receber um exemplar da Raça Gir, vinda diretamente da Índia. A partir de 2007, o cenário da fazenda começou a mudar através do arrendamento de uma parte significativa para a formação do primeiro canavial.
Ao longo de seis anos, Milani tocou a operação com gado na área em que não foi plantada cana, além de empreendimentos imobiliários (outro braço de seus negócios), não se envolvendo diretamente com a cultura, que recebia todo o manejo por parte da usina.
Contudo, ao final desse período, o contrato de arrendamento venceu e por diversos motivos acabou não sendo renovado, caindo no colo do proprietário um novo negócio do qual ele não fazia a menor ideia de como trabalhar. “Toda a minha estrutura de máquinas, implementos e pessoal era configurada para o gado”, conta Milani.
Por dois anos ele buscou a ajuda de vizinhos e da usina através da locação de máquinas e terceirização dos tratos culturais para fazer o básico. Sem reformar nada, a produtividade foi decadente em decorrência da alta idade da cana.
Até aqui uma história comum para as regiões de Barretos e Araçatuba, que viram seus pastos se tornarem canaviais num estalar de dedos contudo, com muito pouco ou melhor planejamento de implantação estratégico.
Passados oito anos, Milani decidiu mudar a história melancólica que atinge diversos fazendeiros e passou a agir para transformar a classificação do seu filme de drama para um conto motivacional.
O marco dessa reviravolta passa pela chegada do minucioso veterinário Élio do Nascimento Meirinhos, que veio para ser o gestor operacional da cana-de-açúcar, mesmo não sabendo nada sobre a cultura, assim como o seu chefe.
Porém, o profissional recém-chegado não demorou para procurar quem entendia do assunto. Encontrou na Canaoeste e no Grupo Tereos o suporte que precisava para desenvolver um plano estratégico de longo prazo, visando atingir ganhos expressivos de produtividade e, com isso, tornar o negócio rentável.
Pronto, estava formado o quadrado virtuoso formado por um investidor e gestor financeiro; um profissional para gerir, nos mínimos detalhes, cada etapa do planejamento desenhado, uma associação simbolizando o conhecimento técnico, jurídico e ambiental – fundamental para o negócio – e a usina com o suporte necessário no sentido de execução de diversos manejos.
Assim, a produtividade da fazenda evoluiu de uma média inferior a 80 toneladas por hectare, crescendo 10 toneladas somente no primeiro ano sob essa nova filosofia. Em 2019 atingiu 104 toneladas por hectare, lembrando que nessa média ainda há 80 hectares do canavial velho, aquele plantado pela usina.
Para chegar a essa curva ascendente foram praticamente revistas todas as etapas da produção e implementadas mudanças, sempre baseadas e comprovadas em estudos prévios.
Ao ampliar o zoom desse escopo é encontrada uma das ações mais disruptivas, a rotação prolongada de cultura, em que após a eliminação da soqueira é realizado um plantio de soja seguido por uma safrinha de crotalária e, outra vez, os grãos antes de entrar com a cana-de-açúcar.
Sobre a prática, Milani conta que mesmo tendo sido planejada e executada em blocos – visando à manutenção da produção de modo a preservar pelo menos uma entrada mínima de recursos -, isso exige uma resiliência financeira tal que somente a certeza na eficiência do planejamento permite que o produtor se mantenha firme na atividade.
Este sangue frio no bolso é facilmente exemplificado ao observar a situação vivida na última safra de verão (18/19), quando se iniciou a maior extensão em reforma e consequente plantio de soja (100 hectares).
Como todos sabem, o período foi marcado por uma verdadeira tragédia pluviométrica, tendo algumas regiões de Barretos registrado média de chuva abaixo dos 30 mm em pleno mês de janeiro.
O resultado só não foi pior porque havia na estratégia de ação o seguro da safra, que precisou ser acionado. Diante disso, o caixa da fazenda atravessou 2019 inteiro sem a renda de 100 hectares de cana e soja, um aperto e tanto.
Somado a isso, e prova de que o planejamento vem em primeiro lugar, foram arrancados 30 hectares de soqueira em 2019, fazendo com que em 2020 não sejam produzidos 130 hectares de cana.
Contudo, os frutos da persistência serão colhidos em 2021, quando os 100 hectares receberão o primeiro corte, safra em que todos esperam quebrar o recorde de produção da propriedade, que é de 32 mil toneladas, e por aí se manter crescente e com um ciclo alto em decorrência da qualidade do solo que é a morada do novo canavial.
Porém, somente a reforma prolongada não é garantia para se atingir a meta de um ciclo próximo a dois dígitos, tendo em média 100 toneladas por hectare. Outra ação que está em letras garrafais nos planos é a intolerância às plantas daninhas.
Segundo Meirinhos, após cinco anos de trabalho o índice de infestação da lavoura está em 1%. Para chegar até esse resultado, ele conta que iniciou o combate de fora para dentro do talhão, com uma preocupação extrema com as bordaduras, cuidando até da eliminação em áreas vizinhas e utilizando catação constante com a ajuda de todos os colaboradores que, ao andarem de carro com uma enxada e ao menor sinal da presença de uma planta invasora, a arrancam na hora.
No miolo do canavial, o gestor operacional diz que a tática é a utilização do autopropelido ao identificar alguma reboleira, que é combatida, não considerando o tamanho da cultura. Não há espera para eliminar as plantas daninhas.
A escolha pelas variedades atende a um fator primordial. Como a propriedade fica muito próxima da cidade, há preocupação quanto às queimadas e, diante disso, a cana é retirada no início da safra (antes da seca). Assim, a propriedade é dividida basicamente por três cultivares: RB855156, RB966928 e RB855453.
Outras medidas também estão sendo tomadas para evitar o fogo criminoso, como o plantio de cerca viva por todo o perímetro da fazenda e a abertura de carreadores externos que chegam a oito metros.
Um detalhe interessante é na segurança que o produtor tem na colheita realizada pela usina (Grupo Tereos). É utilizada uma frente terceirizada pela unidade industrial, garantindo assim relativa segurança quanto à qualidade e pontualidade na execução do serviço.
No processo de colheita também contribui para tudo evoluir da melhor maneira possível a sistematização das áreas novas, que tem como tiro mais comprido 1,85 mil metros, atravessando quatro talhões. O projeto contempla ainda os locais de transbordo e carregamento para o transporte.
Como consequência, boa parte da cana é colhida com o piloto automático da máquina ligado, o que no levantamento de perdas da última colheita mostrou pouco mais de uma tonelada por hectare nas áreas novas, enquanto que ainda no canavial velho foram deixadas para trás quase nove toneladas.
Uma terceira medida fora da curva está na busca constante por conhecimento, prática que o proprietário da fazenda trouxe de sua experiência em empreendimentos de urbanização. Antes de tomar qualquer ação, ele pesquisa, estuda e planeja.
Isso fica claro no manejo de insumos, onde tudo que é utilizado passa por um teste. Dessa maneira, tanto a adubação como a estratégia de defesa contra pragas e doenças são feitas integrando produtos de origem química e biológica.
Como o objetivo é que cada colaborador tenha essa visão, é considerada fundamental a qualificação da equipe, que participa da execução dos testes de campo, conhecendo, na prática, os resultados. Além disso, são realizados cursos internos e há capacitação para o uso das máquinas adquiridas pela propriedade.
Perante tudo o que foi possível conhecer, o mais interessante é que o quadrado de opiniões não formou um muro fechado. Cada lado contém grandes arcos totalmente abertos onde há um fluxo de entrada constante de conhecimento, seja ele vindo da construção civil ou pecuária, tendo em vista as outras atividades do investidor e gestor financeiro da operação, José Armando Milani, ou da experiência e testes executados pelo veterinário Élio Meirinhos, que o torna um verdadeiro cirurgião do canavial.
Sem esquecer da Canaoeste, representada pelo agrônomo da filial de Barretos, Felipe Volpe. Por trás dele passa um verdadeiro treminhão lotado da mais profunda sabedoria em conhecimento técnico, ambiental e jurídico.
Para finalizar, todo o suporte da usina é configurado pelo agrônomo do Programa Tereos em Campo, Eduardo Saiga Filho, e pelo supervisor de fornecedor de cana da Unidade São José, Leandro Gomes Maia, que não medem esforços para consolidar cada vez mais essa parceria pois sabem que além de ser um trabalho sério, poderá ser replicado em outras áreas, elevando a quantidade e qualidade da cana que será moída pela empresa.
Fonte: Revista Canavieiros
Por: Marino Guerra
Foto: Rodrigo Moisés